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Do Princípio Dilbert à Administração Pós-Moderna

Claudemir Oribe – Mestre em Administração pela Fundação Dom Cabral e Sócio Consultor da Qualypro.

26/11/2009




Na década de 90, eram bastante populares as tirinhas de um personagem caricato do ambiente de trabalho chamado Dilbert. Esse personagem foi criado por Scott Adams, um americano e empregado típico - submisso e obscuro - de duas grandes corporações. As tirinhas cômicas mostravam como os trabalhadores eram colocados diante de situações ridículas e absurdas por chefes incompetentes, insanos e até mesmo, sádicos. Diante disso, é fácil deduzir que elas caíram rapidamente no gosto do público. O livro Princípio Dilbert ocupou o topo da lista dos mais vendidos do New Yor Times e Dilbert chegou a ser considerado uma das 25 pessoas mais influentes dos EUA1 !

Scott Adams não perdoava nada. Toda e qualquer técnica ou método de gestão em uso, foi alvo de ironias impiedosas, pois ele se aproveitava de falhas ou insucessos para generalizar um princípio de que tudo que acontece no ambiente de trabalho foi cuidadosamente elaborado para alienar as pessoas.

A ISO 9000 não foi exceção. Dilbert usou criatividade e senso crítico incomuns para identificar sentimentos negativos e hilários provocados por implementações de sistemas da qualidade exagerados, mal feitos ou sem sentido. No fundo, ele mesmo viria a reconhecer que queria só fazer rir e ganhar dinheiro. Mas o recado sobre o que pensava sobre Qualidade permanecia. Eu uma de suas tiras, Dilbert está tomando café quando uma pessoa chega para fixar etiquetas em tudo o que vê pela frente. Indagado por Dilbert sobre a necessidade disso, o funcionário afirma que é a ISO 9000 que exige. Dilbert responde que só um idiota faria isso, enquanto assiste seu colega deixar a sala com a tal adjetivo escrito em suas costas. Passados cerca de 15 anos, vale a pena revisitar Dilbert para analisar como implementamos sistemas de gestão no passado, como o fazemos hoje e como faremos no futuro.

Na época de Dilbert, a norma ISO 9001 em vigor era a versão 1994 - uma tímida evolução da primeira versão de 1987. Naquele tempo havia muitas dúvidas sobre como implementar SGQs. As consultorias se proliferaram e as poucas empresas certificadas eram constantemente visitadas. Fóruns de discussão aconteciam a todo tempo e em todos os lugares, e as experiências eram repassadas em numerosos artigos e, principalmente, de boca em boca.

Os sistemas de gestão da qualidade, que eram denominados de sistemas de garantia da qualidade, costumavam ser imensos, com centenas de documentos e formulários para tudo, incluindo, servir café. A ordem era escrever o que você faz e fazer o que você escreve e, pecar por excesso, era o critério aceitável para o tamanho do trabalho a ser feito. Tudo devia ser etiquetado e marcado para que qualquer um pudesse identificar. O temor de não passar numa auditoria superava o temor de perder um cliente. As pessoas eram treinadas para receber o auditor e a preocupação com a qualidade chegava a ser secundária. Tais práticas ocupavam exageradamente as pessoas no mero cumprimento do que foi escrito, nem sempre de forma útil, servindo, portanto, como um prato cheio para Scott Adams.

De lá para cá, tivemos duas revisões na norma, a versão 2000 e o amendment 2008. A versão 2000, houve uma radical alteração de conceitos e princípios. A gestão de processos, o desdobramento de competências, a melhoria contínua e a medição da satisfação de clientes, comprometimento da direção, o foco no resultado e a concepção sistêmica são apenas alguns dos novos elementos publicados há quase dez anos e que estão aí, à disposição das organizações para servir de referência à construção de modelos de gestão próprios e que sirva aos propósitos organizacionais e aos mercados que atendem.

No entanto, embora a norma seja farta de boa fundamentação das diversas perspectivas da administração2, Dilbert ainda teria motivos para muitas charges. Embora um esforço enorme seja dispendido o tempo todo para manter as organizações certificadas, pouco tem sido feito no sentido de transformar o sistema de gestão da qualidade em procedimentos úteis.

Uma única questão, dirigida à cada prática elaborada com a suposta intenção de manter o certificado, pode comprovar tal assertiva: “? Quem usa este procedimento/registro?” Se a resposta for “só o auditor”, eis aí uma evidência fortíssima de que aquela prática não é adequada aos propósitos da organização.

Notas:

[1] No de 1997, Dilbert apareceu na capa da revista Time, como uma das 25 figuras mais influentes dos EUA (America's 25 Most Influential People) Fonte: Time, ed. 21 April 1997. Disponível em http://www.time.com/time/covers.

[2] A ISO 9000 possui requisitos relativos à formalização, definição de responsabilidades e autoridades, políticas e práticas que remetem as teorias Clássicas, Neoclássicas, Estruturalista, Administração por Objetivos, Abordagem Sistêmica, Intitucionalista, Relações Humanas, Contingencial e sobretudo da Gestão da Qualidade, se constituindo um verdadeiro mosaico de aprendizado acumulado em mais de 100 anos de história administrativa.

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